‘BC sinaliza alta de 0,25 ponto, mas com desejo de parar’, diz Truxt – Valor, 04 de agosto de 2022
Para Arthur Carvalho, da Truxt, Copom manteve porta aberta para mais uma alta, mas deixou possibilidade de, caso dados melhorem, encerrar ciclo com o juro nos atuais 13,75%
Por Lucinda Pinto — De São Paulo
Ao comunicar sua decisão de subir a Selic em 0,5 ponto percentual, o Copom manteve a porta aberta para mais uma dose de alta, agora de 0,25 ponto percentual. Mas deixou na mesa a possibilidade de, caso os dados melhorem, encerrar o ciclo com o juro nos atuais 13,75%, porque teme que o efeito defasado da política monetária tenha um impacto forte demais daqui para frente. Essa é a leitura do economista-chefe da Truxt Investimentos, Arthur Carvalho. “Parece que a porta está aberta, mas que o desejo é de parar”, afirma.
Para ele, ao expressar esse desejo, o BC está demonstrando menos preocupação com a piora das expectativas de inflação e também com a dinâmica da inflação subjacente, principalmente no setor de serviços, que segue muito resistente. “Desacelerar inflação de serviços demora, é custoso. E ele já está parecendo que, se der um sinal [positivo da inflação], ele para”, diz
O cenário base do economista é de que o BC suba o juro em mais 0,25 ponto e pare. “Mas eu acho que o cenário de 14,25% é bem próximo”, diz. Para o IPCA, sua projeção é de uma taxa de 7% neste ano e de 5,3% para 2023.
Veja, a seguir, os principais pontos da entrevista:
Valor: Qual foi a mensagem do comunicado do Copom?
Arthur Carvalho: O Copom deixou a porta aberta para subir mais uma [vez]. Ao mesmo tempo em que ele se protegeu um pouco, quase que num desejo de que ele possa parar, ao dizer que o ciclo está muito avançado, de que ele vai reagir aos dados. Ele sinalizou que, se o cenário continuar assim, ele pode subir o juro em mais 0,25 ponto, mas, se melhorar, ele para. Parece que a porta está aberta, mas que o desejo é de parar. Talvez não fosse o que eu faria, eu sinalizaria mais uma alta de 0,25 e não expressaria esse desejo de, se puder parar, porque mostraria um comprometimento maior em ancorar as expectativas.
Valor: Por que o BC tem o desejo de parar o ciclo? Há uma preocupação com o efeito da alta que já foi realizada?
Carvalho: Acho que ele acha que já subiu muito, e subiu rápido. E como a política monetária é muito defasada, ele está com medo disso bater muito forte. Se não tivesse os estímulos fiscais, que teremos agora em agosto, setembro e outubro, esse receio seria válido. Mas, diante desse estímulo, acho que isso parece mesmo mais um desejo.
Valor: Quando o Copom expressa que deseja parar, ele enfraquece o efeito da comunicação sobre as expectativas?
Carvalho: Eu acho que, na margem, sim. Não é dramático, como se anulasse, mas mostra que ele quer parar, que ele está forçado a continuar o ciclo. E mostra um pouco menos de preocupação. Eu acho que, dado que as expectativas estão se movendo ainda, o BC deveria estar mais preocupado. E ao expressar esse desejo, ele parece estar menos preocupado do que eu estou.
Valor: A sua preocupação reside em que exatamente, à surpresa da inflação vinda da resiliência da atividade? Ou tem mais a ver com o fiscal?
Carvalho: É uma combinação das duas coisas. O primeiro semestre foi bem mais forte [em atividade] e ainda mostra algum fôlego no terceiro trimestre. E, em cima disso, você ainda vai ter o estímulo fiscal. Quando você olha para os indicadores subjacentes de inflação, alguns começaram a ceder, mas a maioria está próxima do ‘high’. Óbvio que não precisa esperar a inflação cair toda, senão você estará apertando demais. Mas ainda tem sinalizações de que a inflação pode se manter elevada por um período prolongado. A inflação de serviços piorou muito e desacelerar inflação de serviços demora, é custoso. E já está parecendo que, se der um sinal [positivo da inflação], ele para. Ele mostra menos preocupação.
Valor: A resiliência da atividade pode refletir que a política monetária está menos efetiva?
Carvalho: Não, acho que nisso vou dar crédito ao governo. Quando você olha 2014 e 2015, quando teve um ciclo de alta relevante, a política monetária era muito menos efetiva porque tinha crédito subsidiado para todos os lados. Acho que o problema não é esse. Acho que essa resiliência tem a ver com o fato de que o mercado subestimou o efeito da reabertura da economia, principalmente sobre o setor de serviços. Foi mais importante a última onda ter acabado e a vida normal ter voltado para o setor de serviços do que parecia para a gente. E isso criou um ‘momentum’ positivo para a economia, uma inércia. E a outra coisa são os estímulos. E agora vai entrar mais auxílio. Mas não é como crédito subsidiado, que entrava direto na política monetária.
Valor: Existe a chance de o BC ter que ir ainda mais longe com o ciclo do que ele sinalizou?
Carvalho: Eu acho que sim, tem esse risco. É super real o risco de, ao chegar em setembro, a economia não tenha desaquecido, a inflação não tenha cedido, as expectativas continuem desancorando, e ele tenha que, mais uma vez, repetir o ‘statement’ de hoje [ontem]. A única diferença é que ele diria que faria uma magnitude igual ou menor, e ter que deixar a porta aberta mais uma vez. Lembre-se que este Banco Central já chegou a sinalizar que iria parar esse ciclo, e acabou dando 2 pontos acima. A história deles [do comitê] é que, quando chega na hora H, se os dados não deixarem, eles reagem, mas com essa hesitação.
Valor: Qual é o seu cenário base para o juro?
Carvalho: Que o BC suba o juro em mais 0,25 ponto e pare. Mas eu acho que o cenário de 14,25% é bem próximo. É muito mais possível, na minha cabeça, do que o cenário de 13,75%.